domingo, 17 de janeiro de 2010

II Domingo do Tempo Comum

Na Eucaristia dominical de hoje é proposta à nossa reflexão a passagem bem conhecida das bodas de Caná. O evangelista João identifica os milagres de Jesus como sinais para que sejamos capazes de olhar para aquilo que eles apontam que é algo de distinto do que à primeira vista parecem ser. Desta forma olhemos para o sinal de Caná tendo em conta que ele se realiza ao terceiro dia (omitido na leitura litúrgica pelo habitual "naquele tempo"), o que para os cristãos traz imediatamente à recordação o domingo da ressurreição; que as bodas esponsais são imagem da aliança de Deus com o povo de Israel (confrontem a primeira leitura de Isaías de que destaco a parte final: "Tal como o jovem desposa uma virgem, o teu Construtor te desposará; e como a esposa é a alegria do marido, tu serás a alegria do teu Deus".); que o vinho é símbolo da alegria proveniente do Amor, cimento daquela aliança; que as seis talhas de pedra, além de o seu número significar algo de incompleto, usadas para as purificações prescritas na lei, significam a antiga aliança (tábuas de pedra) e as suas prescrições; que a exclamação do chefe da mesa que fala de um vinho bom guardado "até agora" significa que este é o tempo da salvação; finalmente, que a figura da mãe de Jesus é símbolo da esperança daqueles que permanecem fiéis à promessa do Senhor.
Como se vê são imensas as referência e as pistas que João nos deixa. Hoje deixo uma leitura muito simples para todos nós, Igreja, onde a diversidade dos dons do Espírito brotam do mesmo Espírito, ao serviço do sonho do mesmo Senhor: o bem e a salvação do Homem (confrontem com a segunda leitura de Paulo 1 Cor 12, 4-11).
Num mundo tão enredado nos seus poderes e feitos tecnológicos que se esquece sobre aqueles à custa dos quais constroi a sua riqueza e a sua comodidade, que subestima o carácter falível do seu conhecimento, que se espanta pela força tão primária da natureza, que desperta estremunhado e incomodado com o aviso natural de que tudo tem um fim e de que nada é eterno, somos chamados a algo mais de que uma adesão sociológica a uma religião.
A um mundo carregado de obscuridade, torturado pela morte de tantos inocentes, que perdeu o vinho da alegria, do convívio solidário, do amor gratuito o crente é chamado a levar, não esquemas antigos, não leis desumanas e anacrónicas, não ritos e costumes que se revelam fontes estéreis e secas de sentido e significado, não a frieza empedernida de quem debita condenações e estigmas sobre os outros que não compreende, não a preocupação com a opinião ou estilo de vida contrários aos "bons costumes".
Pelo contrário, somos chamados é a levar a absoluta novidade de Jesus, o verdadeiro vinho bom e não a zurrapa com que muitos têm vindo, ao longo de séculos, a alimentar ateísmos e terrores, com um Deus que Cristo sempre denunciou e combateu. Jesus é o amor que substitui a lei, é a alegria da festa que substitui o temor do castigo, é o injustiçado sofredor que partilha o sangue, a dor, as lágrimas e os gritos de desespero de todos os que hoje pelo mundo todo e, até à nossa porta, erram pela sua razão à procura de um porquê. Transformar a água em vinho é o desafio da Igreja de hoje e de ontem: dar sabor e sentido à existência. Que sabor é o nosso? Vivemos uma fé encorpada e real? Espalhamos uma aroma de frutos sempre novos e frescos? Estamos ao serviço do convívio e da solidariedade? Sentamos à mesa, à mesa do verdadeiro pão e do verdadeiro vinho, todos os homens e mulheres sem excepção nem distinção, sem perguntar por estados de vida nem pelo passado? Somos um vinho apelativo e gratuito pata todos?
Ah Maria, minha mãe, ajuda-nos a todos, a todos mesmo, a fazer tudo o que Ele nos diz...

2 comentários:

Salete disse...

Tantas vezes esquecemos que basta fazer tudo o que ELE nos diz...
Quando o silêncio do coração e da alma é o espaço ideal para O encontrar... o espaço ideal para perceber o que ELE nos diz... como não o procurar insistentemente!!!
Mesmo se consciente que o silêncio está a tornar-se um espaço tão difícil de conquistar... como que invadido e preenchido pela rotina e pela "pressa" dos meus dias...
Mas este é o segredo: Estar atenta, particularmente mais atenta, e fazer tudo o que ELE me sugere nos "espaços" e momentos dos meus dias que LHE reservo, sob a protecção da paz que só ELE me consegue dar!

Fernando Mota disse...

O silêncio, exterior e interior, é sempre tão difícil de encontrar. A atenção de que fala é a atenção de Maria em Caná. Uma atenção ao outro que (lhe) aponta sempre Jesus como Caminho e Regaço. Uma boa semana, amiga.