domingo, 26 de abril de 2009

III Domingo da Páscoa

Do medo à perturbação, da perturbação à alegria, da alegria ao testemunho (mártures=mártires): foi esta a lenta e enigmática evolução dos discípulos e das discípulas de Jesus depois da sua morte. Desta evolução nasceu a nossa convicção da Sua ressurreição.
Neste domingo, escutamos o mais audaz texto da ressurreição (Lc 24, 35-48), onde Jesus afirma não ser um espírito, onde mostra ter carne e ossos, onde come à frente de todos. Com isso quer dizer-nos: "Não sou um fantasma do passado, não sou uma ilusão de corações saudosos, não sou uma intuição racional ou mística, não sou um acontecimento histórico longínquo mas sou presença viva em qualquer lugar, em qualquer tempo. Venço todas as barreiras físicas e todas as coordenadas de tempo para pedir a única barreira que sou incapaz de ultrapassar: a opção pessoal de cada homem e de cada mulher para ser minha testemunha no mundo. Testemunha do amor divino, do arrependimento e do perdão dos pecados".
Foi quando experimentaram esta realidade que aqueles homens e mulheres iniciaram um movimento, que incarnados na humanidade como nenhuma outra religião (por isso, cometendo tantos erros e tantas atrocidades como tantas maravilhas e tantos gestos de amor radical e admirável), chegou até nós crentes da última hora. Mas hoje vivemos como que encerrados nas paredes das nossa comunidades, das nossas burocracias, das nossas tradições, das nossas quinquilharias eclesiásticas sem percebermos porque tantos não dão ouvidos ao nosso testemunho. E porquê?
Porque deixamo-nos de encantar com a alegre notícia pascal, porque deixamo-nos perturbar com os acontecimentos do nosso mundo (tal como os discípulos de então). Ainda não saímos da perturbação que os dias que correm nos provocam e, em vez de proporcionarmos a experiência de Jesus a nós e aos outros, cansamo-nos em defender a indefensável exclusão, em propor insuportáveis cargas moralistas, em olhar as mãos trespassadas de Cristo como sinal de pecado em vez de sinal de amor e de graça. Jesus não pode ser um fantasma na nossa Igreja, onde ninguém vislumbra a Sua realidade viva, a actualidade libertadora da Sua palavra, a suavidade amorosa dos Seus gestos carregados de acolhimento e perdão.
"Porque estais perturbados e porque se levantam esses pensamentos nos vossos corações!", eis a questão que fica neste domingo... Eis a questão que temos que nos colocar: porque andamos perturbados?

1 comentário:

Salete disse...

Estranhamente parece que alguns cristãos esqueceram as palavras que Ele próprio usou quando reafirmou a Sua Ressurreição!
Não sentem como é concreta a Sua presença, como é "palpável" a Sua existência.
Colocam-NO encerrado na história, preso no passado.
Falta uma espiritualidade preenchida com aspectos concretos que ensinem a viver o evangelho, mas mostrando que é possivel vive-lo 24 sobre 24 horas, e que é possivel encontra-lO em cada um, em cada esquina e lugar!
Se soubessem como é extraordinária a sensação de senti-LO vivo, não mais queriam viver de outra forma...!