Além dos encontros familiares e das celebrações religiosas, estas férias de Natal caracterizam-se por muito trabalho individual. Finalmente comecei a escrever a minha última unidade lectiva para os manuais de EMRC, organizo apontamentos para começar a estudar para os exames da faculdade e planifico o meu segundo período no colégio. Ontem tive reunião, no Porto, toda a manhã, com a equipa de elaboração dos manuais e à tarde regressei aos meus apontamentos sobre a Igreja, tema da referida unidade lectiva.
Neste último dia do ano, gostaria de deixar aqui uma pequena reflexão sobre o tempo. Os gregos tinham duas formas de falar de tempo: cronos e kairós. Cronos, na mitologia grega, é o tempo e a divindade que mutila o pai e devora os filhos, desligando-se do passado e dizendo não ao futuro, respectivamente. Assim, cronos é o tempo do momento, fragmentado, sem sentido, sem liberdade, sem história. O cronos é como esses não-lugares que pululam nas cidades: o átrio da estação por onde todos passam, mas que nada é como lugar de encontro, de urbanidade, de relações; as salas de espera de uma qualquer repartição de finanças ou loja do cidadão; essas praças centrais por onde todos passam mas ninguém se vê e permanece. Cronos é o tempo da solidão, do vazio, do isolamento na história e no mundo, onde nada acontece, onde tudo passa inexoravelmente. O passado não existe nem se lê nem se valoriza e o futuro é o que for, nada se aforra, nada se prepara, nada se espera. Por isso, é que o fim-de-ano me incomoda. Primeiro, porque parece que o Natal já era (e não, amanha faz oito dias que aconteceu e para os crentes ainda é dia de Natal) e depois e por isso, há que arranjar depressa outra festa, outra celebração porque não aguentamos o tédio que é viver e a percepção de que tudo passa tão depressa. Então lá surge este dia, como outros ou como o fim-de-semana, em que há que voltar a subir as sensações, as experiências, os êxtases para que as emoções à flor da pele nos impeçam de pensar os dias, olhar o tempo e procurar o sentido de um tempo que nos parece trazer presos na sua voracidade e circularidade.
O kairós é o tempo como momento oportuno, oportunidade, o tempo aberto à surpresa e ao mistério do outro em toda a sua originalidade e dramaticidade. É o tempo de Deus e do Homem, o tempo do Natal e da Páscoa, o tempo em que se assume o que se foi, é e perspectivasse e constrói-se o que se será. O kairós é o momento de fazer o amanhã, aprendendo com o ontem. É o tempo como local de salvação, isto é com sentido e não à deriva. É o tempo não como prisão, mas como oportunidade a ir mais além.
Assim, entro no novo ano com uma tranquilidade absoluta e uma esperança resoluta no futuro. O que será 2010? Uma oportunidade à vida e ao outro. O resto serão acontecimentos com que tentarei ler e significar a história. Como vou passar o ano? Com aqueles que mais me são significativos porque o tempo é lugar de encontro e de partilha. E não algo que se consome e me consome. Deixa marcas? Ainda bem, são sinal de vivi e vivo a vida...
Um bom 2010.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário