No evangelho de hoje de novo se sublinha o que é e o que implica ser discípulo de Jesus. A cena deste homem rico já foi muitas vezes reflectida, mas quase sempre fica pela leitura material da sua riqueza. Mas será interessante juntar a essa leitura a ideia de como aquele bom homem rico via a dimensão religiosa da sua vida. Como vamos ver, a sua perspectiva enferma da perspectiva de muitos crentes.
Atente-se no tom apressado e urgente que ele coloca na sua acção (aproximou-se correndo de um Jesus em caminho) e na pergunta que ele lança a Jesus: que hei-de fazer para herdar a vida eterna? Jesus coloca um travão em todo este entusiasmo e, diante de uma pergunta que pede coisas para fazer para poder herdar algo, Jesus responde-lhe na mesma moeda apontando-lhe o caminho da religião tradicional que é o caminho de cumprir leis, o caminho que faz um homem ser um bom homem, o caminho da razoabilidade [não matar, não cometer adultério, não roubar, não mentir, honrar o pai e a mãe (com este texto vem-me sempre à memória aqueles que dizem que não pecam porque não matam nem roubam. Aqui estão eles)].
Mas diante da insistência daquele entusiasta em querer ir mais longe, então Jesus acredita que tem diante de si um potencial discípulo, alguém que quer entrar no caminho que Ele estava a percorrer (para Jerusalém: caminho do amor total), e olha-o com amor e, usando a linguagem dos negócios e também dos negócios religiosos, propõe-lhe o caminho cristão em quatro imperativos: vai (vender), dá, vem e segue-me. E aqui o homem prefere a riqueza, a segurança da sua religião, o razoável das suas opções.
Jesus não só desanima aquele potencial discípulo, como espanta os que o acompanhavam: "Quem pode então salvar-se?". Jesus escandaliza porque afirma que ninguém, por mais que tenha, por mais que cumpra, por mais que reze, por mais que seja bom não encontrará a salvação se só se procurar a si e o seu bem-estar (que tenho eu que fazer para herdar para mim a vida eterna?) e se colocar em si, na sua crença, nos seus poderes a possibilidade de ter a salvação. Quem assim pensar não segue Jesus, não se coloca nas mãos amorosas do pai, confia só em si e não precisa de salvação. É por isso, que os discípulos se escandalizam e apresentam os seus grandes feitos ("olha que nós deixamos tudo para Te seguir".) Mas o seu escândalo só demonstra que também eles ainda o seguiam à espera de alguma herança, de alguma riqueza, de algo mais...
A grande questão que se coloca a nós seus discípulos é até que ponto estamos à espera de uma herança? Até que ponto não esperamos ser recompensados pela nossa opção por Cristo? Até que ponto não estamos tão auto-convencidos da nossa fé e dos nossos créditos diante de Deus que esquecemos que a Vida é um dom absolutamente gratuito do amor sem condições do Pai?
Ser discípulo de Jesus é segui-lo em tudo o que ele é, em toda a sua forma de vida e, agarrado por aquele olhar cheio de amor, colocar a sua vida frágil, errante, pobre, de barro nas mãos daquele que do fraco faz forte. O discípulo do Mestre só sabe que nada tem para lhe apresentar senão o corpo fragmentado da fragilidade humana. É por isso que o cristão sabe e conhece-se como o mais pequeno dos filhos do homem...
Quando há quatro anos atrás reflectia sobre o rumo a tomar na minha vida foram estas palavras de Jesus que me desinstalaram: tinha que ser mais radical; não chegava ser Seu ministro precisava de ser Seu discípulo; não chegava ser bom homem ou bom padre, faltava ir, vender, dar e vir para o meio do mundo para aí O seguir. Perdi seguranças, apoios, comodidades, sucessos, dinheiro, amizades, reconhecimento social... Mas hoje, mais do que nunca, estou nas suas mãos (quantas vezes a querer delas saltar...), tento segui-lo nos caminhos da vida (quantas vezes me engano...) e nada tenho a apresentar-lhe como factura porque tudo o que sou é obra do Seu amor incompreensível e paciente por mim. Sim, com dificuldades ("perseguições"), tenho recebido "cem vezes mais" sem nenhum mérito da minha parte. Assim se manifesta o Seu poder...
domingo, 11 de outubro de 2009
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1 comentário:
Este jovem sentia-se especial... queria ser diferente, já não lhe bastava o cumprimento das regras tradicionais...
Mesmo se estas implicam pequenos passos diários, a descoberta do valor das acções concretas...
Será que temos noção da importância de cada passo, ou do percurso que ainda falta percorrer para sermos capazes de aceitar o convite a segui-lO?
Ou também nos sentimos especiais e não entendemos que necessitamos das regras tradicionais para fazermos caminho rumo a ELE!
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