terça-feira, 20 de outubro de 2009

Sacanas Sem Lei

No domingo à tarde fui ver o último filme de Tarantino, Sacanas Sem Lei. Fica já aqui explicita a minha declaração de interesses: sou um apaixonado de Tarantino desde que há muito tempo (1994) vi o magnífico Pulp Fiction. Nunca mais perdi um filme seu (mesmo o anterior àquele, Cães Danados)
Em Sacanas sem Lei voltei a reencontrar-me com os seus diálogos inesquecíveis [quase todas as cenas, são cenas de longas conversas de pessoas que se olham, simulam, gesticulam (por vezes fatalmente...), criam ambiguidade, enfim personagens de carne e osso], com as suas citações cinematográficas (western, cinema de espionagem da segunda guerra mundial, evocação do cinema de propaganda da própria segunda guerra, etc.), com a sua magnífica direcção de actores e de banda sonora e com a sua recorrente (Kill Bill e A Prova de Morte) vingança feminina.
Não é um filme sobre a guerra nem sobre a guerra de 39-45, mas é uma recriação da história tendo como pano de fundo não só o poder do cinema (Tarantino dixit), mas também o poder do boato, da fama criada, do nome com que o inimigo apelida alguém que se evidencia pelo seu carácter aterrador. Todos têm um apelido: o apache, o urso, o caçador de judeus, o judeu, o leiteiro, os próprios Sacanas Sem Lei, etc. É o poder da imagem cinematográfica, da imagem que o terror desperta nas mentes, da imagem que a propaganda delineia e apregoa, da imagem que os artistas criam, da imagem terrível da vingança (recordo a cena final de Shosanna a rir-se por entre chamas) que este filme retrata. E ninguém melhor para manipular a imagem como cinema que um enciclopédico cineasta como Tarantino. A imagem mais do que uma realidade empírica é uma construção mental que influencia a vida e que a pode tornar manipulável. Ser um filme a dizer isto é algo de brilhante.
Uma palavra final para Christoph Waltz que, apesar da menos conseguida reviravolta final da sua personagem (culpa a que é alheio), arranca uma portentosa interpretação de oficial das SS. Aliás, o filme é também uma delícia na arte de bem representar.
Apesar de não ser para mim o melhor Tarantino, existem imagens, diálogos e momentos inesquecíveis que se juntarão aos muitos ícones com que este artista do cinema tem pontuado a história da sétima arte.

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