domingo, 21 de junho de 2009

XII Domingo do Tempo Comum

A cena do evangelho deste domingo foi sempre interpretada como a barca da Igreja que, no meio das tormentas e tempestades do mundo, nada deve temer porque traz dentro de si sempre o seu Mestre, que a protege, guia e lhe dá vida. Nessa barca o cristão não deve desesperar porque O Senhor está sempre com a sua Igreja.
Não coloco em causa, de maneira nenhuma, esta leitura tão legítima como fundada numa longa tradição hermenêutica. Proponho sim uma outra leitura, a partir das duas perguntas de Jesus aos seus discípulos: "Porque estais assustados? Ainda não tendes fé?" Estas duas questões mais que dirigirem o olhar para o próprio Jesus, obrigam-nos a olhar a tempestade, a revolta do mar, isto é a olhar os sinais do tempo, os sinais do nosso tempo, no nosso mundo, na vida de cada um. De onde vos vem o medo? O que vos provoca tamanha angústia, desesperança, tristeza, horror? Onde está a vossa fé que vos ajuda a ler os sinais dos tempos? Onde está a vossa fé que lança o olhar para lá do visível, para o essencial?
Assim, o evangelho deste domingo lança-nos o olhar para dentro de cada um de nós e da nossa Igreja: de onde vem o meu horror, o meu medo, a minha angústia. As perguntas de Jesus pedem-nos para erguer a cabeça do nosso eu para os problemas do mundo à nossa volta: como olho os sinais do meu tempo? Como vejo as opções e as atitudes dos meus contemporâneos? Como interpreto as opções culturais e civilizacionais do meu tempo?
É que por vezes, a habitual interpretação deste texto pode-nos levar a pensar que estamos sempre certos, que, porque levamos o Mestre na nossa barca, nada temos a aprender com os sinais do tempo e com as opções do homem. Pode-nos fazer sentir que tudo o que vem de fora e se passa à nossa volta é mau e nada nos ensina e nos faz reflectir sobre as nossas opções e as nossas acções. Penso que o que Jesus nos quer dizer é que qualquer tempestade na vida pessoal de cada um e qualquer tormenta no mundo que nos rodeia não são forças malignas a condenar e a travar mas são uma oportunidade única para nos colocarmos em questão e para crescermos como homens e como crentes. É que se o vento obedece ao Senhor é porque o conhece e também é seu; se o mar ouve a sua voz é porque é obra divina e tem um papel no mundo, logo não são obras do mal, mas são vozes que temos que escutar, gestos que temos que interpretar, acontecimentos que nos impelem a uma avaliação pessoal e comunitária para lhes podermos dar uma resposta de vida. O vento e o mar fazem parte da vida, estamos neles mergulhados e não podemos nem fazer de conta que não existem nem temer quando fazem ouvir a sua voz. Quando o fazem nós Igreja só temos uma atitude: unidos ao Mestre escutemos seus anseios, ouçamos suas revoltas, compreendamos suas dores. Só assim fazemos a paz. Só assim escutamos o outro. Só assim transformamos o mundo.
Não peçamos ao Senhor que nos livre das tempestades mas que nos ensine a lidar com elas e a dar-lhes respostas que integrem e não alienem nem desintegrem.

1 comentário:

Salete disse...

"Não peçamos ao Senhor que nos livre das tempestades mas que nos ensine a lidar com elas e a dar-lhes respostas que integrem e não alienem nem desintegrem."
O pedido que nos deve orientar antes de enfrentar qualquer dificuldade, ou quando esta surja.
A coragem que por vezes nos falta, que nos faz sentir sozinhos na nossa "barca", o pânico que nos assombra e antecipa a reacção serena de quem sabe e sente que nunca está só.
Ter esta noção sempre presente, ajudará a ultrapassar qualquer dificuldade e a estar sempre em sintonia com Ele!
Obrigado por o relembrar de uma forma tão clara e concreta.