O estilo apocalíptico, ao contrário do pensamento judeu, nos anos prévios e posteriores a Jesus, tem um escasso eco nos escritos cristãos. Além do último livro da bíblia, encontramos nos evangelhos um ou dois capítulos marcados por aquele estilo. Hoje, com o chegar do fim do ano litúrgico, lemos um excerto do discurso apocalíptico de Jesus, no evangelho de Marcos.
É preciso deixar desde já bem claro que a fé cristã (apesar, de um prática secular de anúncio aterrador e terrorista do fim castigador do mundo) não tem na sua raiz nem na sua génese a visão de um deus que, cansado pelas maningâncias dos homens, descarrega a sua ira e a sua vingança sobre o mundo e que retribui a cada qual a sua merecida e justa herança, seja ela a glória ou o eterno sofrimento. Pensar num deus vingativo ou até vê-lo por detrás das mudanças climáticas ou da expansão de diferentes epidemias ou dos perigos dos desenvolvimentos tecnológicos é uma contradição insanável com o núcleo mais elementar e mais sólido da fé cristã. Deus não pode servir para amedrontar nem para manipular mentalidades, comportamentos e olhares sobre a realidade (sempre negativos e suspeitos) porque um deus assim não é o de Jesus Cristo.
Então que dizer diante de um Evangelho como o de hoje?
Antes de mais, impõe-se um questão: segundo o anúncio de Jesus quem é que vem? "O Filho do homem sobre as nuvens". Logo, vem o amor; vem aquele que é amor; vem aquele que dá a vida pelos que ama. Recordo, que esta mesma expressão usará Jesus diante do Sinédrio para afirmar a sua divindade. Isto é, eu sou Deus, sou o Filho de Deus, mas ao contrário do que pensais não venho com o poder dos exércitos, dos castigos, das vinganças, mas venho até vós pelo amor que não se impõe nem impõe, que redime e perdoa, que levanta e é dador de vida. Portanto, o fim do mundo não será de terror mas de amor, não será aterrador mas liderado pelo amor. Tu que crês em Jesus, estás a vê-lo a vir como quem castiga, expulsa destrói?
O que se assistirá é a uma grande aflição para os poderosos, para os astros e as estrelas do nosso tempo que sustentam o seu brilho e a sua superioridade na injustiça, no poder, na corrupção, na fome e no desemprego de muitos, na pobreza e na ânsia de ter de tantos, naquilo que tem um fim, naquilo que perece e acaba e não na Palavra que não passa, que é a Palavra feita carne, amor em acto, Jesus de Nazaré.
Assim, o cristão que aposta toda a sua vida na forma de viver de Jesus não desespera diante da aparente vitória dos poderosos, mas espera activa e comprometidamente na transformação do mundo porque sabe que Ele vem e vem todos os dias. Assim, o cristão que segue o Caminho não se sente órfão por caírem ou desaparecerem os líderes de opinião, de estilos de vida, do espectáculo ou da política (cada vez mais espectáculo) porque sabem que o Filho do homem está mesmo à porta, à porta de qualquer desconhecido, mesmo desse grande desconhecido que é a morte, para entrar e fazer comunidade à volta de uma mesa onde todos têm lugar. Assim o cristão sabe que toda a vã maneira de viver, mesmo que carregada de honras, reconhecimentos e posses, está condenada a desaparecer, por entre as nuvens de pó da sua autodestruição, para dar lugar, não ao vazio, mas ao amanhecer de um novo céu e uma nova terra onde todos são reconhecidos e amados pelo que são e não pelo que têm. Ah, assim vale a pena esperar e gritar: Vem Senhor Jesus.
domingo, 15 de novembro de 2009
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